
É assim, bem assim que as coisas me surpreendem...vindo de mansinho,tão eficiente quanto uma cobra,mas assim...de mansinho.
Fazem sete anos que a vi, e como se fosse ontem, lembro do tom de pele, da umidade dos lábios rosas. Ela tinha tudo para ser uma atriz fabulosa, tinha presença de palco e um olhar de canto de olho que colocava medo em qualquer marmanjo atrevido.
Não menti sequer uma vez para ela nas noites em que me perguntava se aquele vestido estava bom, se lhe caia bem o blush, se o decote estava bonito... A mulher que conheci em plenos 18 anos cheirava naturalmente a flores e sorria naturalmente como criança.
Voltei a olhar suas poucas fotos depois de sua partida, pensei em rasgá-las bem miúdas... mas, no outro dia me arrependeria muito. Rasguei então pela metade apenas pois poderia colar caso viesse a tristeza. Rasguei porque me faria um bem danado.
Eu gostava muito de dormir ouvindo Belchior, principalmente seu álbum de 99, que me inspirava os sonhos. Sim, me inspirava os sonhos! E assim, foi bem simples o modo como ela me veio pela calada da noite trazendo uma mensagem bonita, que eu seria feliz. F-E-L-I-Z!!!!
Eu sempre achei que voltaria a ser mesmo, mas ela me dizendo assim, bem dito e com todo seu olhar perfurante, eu passei a acreditar! Ela não estava em meu sonho com o seu perfume, estava sem cheiro, longe, mas ao mesmo tempo senti seu calor em meu lado direito, como quando ela deitava a cabeça em meu ombro para chorar uma coisa qualquer que acabara de inventar. Senti seu calor gostoso e então ela fez a promessa de minha felicidade e se foi, carregada pelo vento.
Despertei triste pois antes de abrir os olhos já sabia que não era verdade sua presença ali no quarto. Fiquei com os olhos cerrados esperando que voltasse a dormir para vê-la denovo... Só mais um pouquinho. Levantei e fui lavar o rosto babado, comi uma banana e seis meses depois voltei para casa, cansada de tanto procurar, pés inchados, boca seca e meus cabelos enrolaram de vez.
Sequer me deu uma pista, um mapa, um trajeto... Procurei minha felicidade colocando nela outra cara que não a sua, debrucei-me no mundo sem entender o que estava fazendo e já que estava de volta, fui preparar uma água quente para descansar...ali, bem no armário das panelas eu vi um pacotinho já aberto chamado felicidade...idiotice a minha ter ido tão longe atrás dele. Fiz água quente para os pés, um cafezinho forte e umas torradas com manteiga e orégano. Vi você em tudo isso e também no meu espelho, quando fui me trocar para dormir. Vi e vejo em cada coisa que faço, um gesto, uma rima, um retrato.
E as coisas vêm vindo assim, bonitas, quando a gente deixa elas virem. Eu ando ouvindo muito Elis Regina pra acompanhar o nível, eu ando sorrindo muito para dar sorte, correndo pouco, pensando o suficiente, cantando e dançando para me manter viva, escrevendo para voltar a criar.
Eu ando!
E assim, berrando nos escândalos de noites venho regurgitando o que não serve, me transformando como borboleta.
E assim, carregando você comigo, aceitei que você nunca foi embora, que aquela morte de avião só te trouxe para mais perto, e quero isso!
Desfocada hoje ou mais tarde essa vida há de ser a mesma que sempre tive e soube carregar e ser carregada. A inventarei e deixarei ser reinventada por puro prazer de ir e vir, de aprender e sorrir.
Eu ando sentindo uma coisa que não cabe aqui, já procurei em CDs, já li um monte de poemas, eu ando sentindo...
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